sexta-feira, 3 de setembro de 2021

Uso Exclusivo em Serviço

 

                Este fato aconteceu em uma das primeiras aulas práticas de Ecologia que realizei no Marajó. Saíamos na sexta-feira de manhã cedo. Partindo, como de costume, da Praça do Operário, em São Brás, Belém, Pará e seguíamos para Icoaraci. De lá embarcávamos na balsa ferry boat para o porto de Camará, Salvaterra, ilha do Marajó. Quase quatro horas depois desembarcávamos em Camará e rodávamos cerca de dez minutos. Aí, já começavam as atividades práticas no Campo Cerrado da beira da estrada. Aproximadamente duas horas depois, embarcávamos todos e seguíamos viagem. Eram mais cerca de 25 km na PA-154 até a beira do rio Paracauarí. Na margem direita do rio, aguardávamos uma outra balsa para embarcar e atravessar finalmente para Soure. Cerca de quinze a vinte minutos depois já em Soure, seguíamos mais cerca de quatro quilômetros até chegar em nosso destino, a comunidade de Tucumanduba, Soure, Pará.

                Da saída do ônibus de Belém até a sua chegada em Tucumanduba, Soure, eram quase seis a sete horas de duração. Convenhamos que era uma boa jornada, quase um triatlo!!! Uma parte dos participantes ficavam alojados na sede da Associação dos Caranguejeiros de Soure e outra parte na Base da ONG Novos Curupiras, uma bem próxima da outra. Cada um levava sua rede, ou colchonete, ou saco de dormir, ou até barraca de camping, além de repelente, garrafinha de água ou cantil e outros apetrechos de uso pessoal. Eu levava o rancho providenciado pela FCAP/UFRA e uma cozinheira da ONG.

                Após o desembarque a arrumação das tralhas e rancho. Em seguida, esperando o almoço, fazíamos uma reunião para comunicação da programação a ser cumprida e dos deveres e direitos de todos, etc. e tal. Alvorada às seis horas da manhã, com direito a fogos de seis tiros! Banho em um único chuveiro, café às sete e às oito, embarque no ônibus para o destino da aula prática do dia. Almoço, só na volta da jornada, o que acontecia lá pelas 15, 16 horas.

                Finalmente, a turma era liberada. Descansar, passear e outros programas eram indicados ou sugeridos. Um deles aconteceu na noite de sábado para domingo. Parte da turma queria conhecer o centro de Soure, ou melhor, queria ir a uma balada. Como era afastado do centro e não existia serviço de ônibus público, só moto táxis, um grupo veio a mim pedir para que o motorista deixasse eles no ônibus da FCAP/UFRA. Argumentei que o motora estava cansado e que eles tentassem negociar direto com o mesmo… E continuei: Que ele só poderia deixá-los. A volta era por conta de cada um. E outros blás-blás-blás. Depois de argumentos e contra argumentos, concordei e acompanhei todos, anunciando que iríamos fazer um reconhecimento ecológico noturno pela cidade e na volta quem quisesse descer em algum ponto, o fizesse, por conta e risco. Saímos. Depois de visitarmos o trapiche, o “point” da cidade, rodamos até a Quarta rua e paramos em frente a uma balada.

                “– Estamos recebendo a visita de estudantes da FCAP!” – ouvi o estrondo do som na aparelhagem colocada na calçada.

                E continuou: “– Governo Federal. Ministério da Educação.Faculdade de Ciências Agrárias do Pará! Uso exclusivo em serviço!” – Putz! O cara leu tudo que tinha na parede lateral do ônibus, inclusive a placa amarela! Todos desceram e entraram no recinto da balada. Fiquei por último e falei ao motorista.

                “– Bora embora! Depois desta recepção, só nos resta ir embora!”

                E nos mandamos pra Tucumanduba.

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Publicado em 01 de março de 2018 em WEBARTIGOS

Lixo etílico

 

                Sempre considerei aprender e ensinar ecologia, que o contato direto com a Natureza é fundamental e imprescindível. Daí meu empenho em realizar aulas práticas, tanto na Ecologia Básica como na Ecologia Agrícola.

                Fucei ambientes dentro, próximos e distantes da FCAP/UFRA. Eram frequentes as aulas nas matas e capoeiras localizadas por detrás da garagem da FCAP/UFRA, a que varava no Departamento de Solos, na Área de Várzea às margens do rio Guamá e muitos outros locais. Pela “picada” no fundo da Zootecnia, superávamos o igarapé Murucutum, por cima de tronco caído, varávamos até a estrada da CEASA passando pelas Ruínas do Murucutum. A mesma coisa era feita pela “picada” da várzea. Atravessávamos uma velha ponte de madeira e alcançávamos a estrada da CEASA. Daí seguíamos até as Reservas do Mocambo e Área de Pesquisas Ecológicas do Guamá, APEG, sempre passando antes pelas Ruínas do Murucutum. A maioria delas feitas caminhando, outras usando o ônibus da FCAP/UFRA ou alugados.

                A minha convicção e segurança foi se firmando e decidi alçar voos mais longos. Os ecossistemas de Campos Cerrados e Manguezais passaram a ser alvo de aulas práticas mais demoradas. Inicialmente, saíamos às 07:00 horas e retornávamos… Bem, a hora de retorno era variada… Meu objetivo era alcançar o campo cerrado localizado próximo à Vigia e o manguezal mais adiante, em São Caetano deOdivelas. Só depois de alguns anos decidi atravessar a Baia do Marajó e fazer as aulas práticas por lá. Mas isso são outros quinhentos mil reais!
O ônibus partia da Praça do Operário,em frente ao Terminal Rodoviário. E lá íamos nós. Como eu sabia que entre os estudantes tinham uns mais afoitos e ansiosos, estabeleci a regra: Nem antes, nem durante a ingestão de bebida alcoólica era permitida. Depois, sim, com moderação, é claro. Só que esse depois, quase sempre era antecipado. Ao finalizar a aula, todos lambuzados de lama do mangue, já na viagem de volta, parávamos no Balneário Santa Rosa, perto de Santo Antônio do Tauá, onde além de fazermos uma refeição, tomávamos banho no igarapé e nos divertíamos. Daí, algumas horas depois, retornávamos ao ônibus para finalizar viagem. Sempre o ponto final na mesma praça. Paradas no meio do caminho eram permitidas e até pegar carona no ônibus que voltava para a FCAP/UFRA eram feitas. Foi numa dessas vezes que aconteceu o fato.

                “– Professor, venha ver o que encontramos dentro do ônibus!”. Falou na segunda feira de manhã, logo após uma dessas aulas, um funcionário da garagem da FCAP/UFRA encarregado de fazer a lavagem do veículo para uso interno, o chamado “bagé”. Fui ver. Putz! Algumas garrafas vazias de Tatuzinho, 51 e outras coisas mais, estavam no assoalho do ônibus! Pedi desculpas a ele, afirmando que isso não iria mais acontecer. Nunca mais! "

                – Como? Uma turma de Ecologia não recolher e dar destino adequado ao lixo produzido?! Pensei eu resignado.

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Publicado em 04 de maio de 2018 em WEBARTIGOS


quinta-feira, 2 de setembro de 2021

O Zero e o Dez em Ecologia

 

                Era na década de 1980, ou 1990, não lembro muito bem. Eu dava aulas de Ecologia Básica para duas turmas de Agronomia, A e B da Faculdade de Ciências Agrárias do Pará, FCAP, hoje Universidade Federal Rural da Amazônia, UFRA. Chegara a época das avaliações. Primeiro NPC. Uma das turmas fez a prova na sexta e a outra faria no sábado. Porém, na sexta houve o fato: A FCAP tinha expulso um aluno que teria ido assistir aula, – pasmem vocês, – de bermuda! No sábado, tudo preparado para a prova, eu esperando a turma na porta da sala, quando chegou uma aluna, parece do Diretório Acadêmico e me disse:

                – Professor, os alunos não vão fazer sua prova em solidariedade ao aluno expulso! – Eu, surpreso, respondi pra ela que haviam outros meios de se solidarizar, blá-blá-blá. Mas não teve jeito. Ninguém entrou pra fazer prova. Então, chamei o meu chefe de departamento, comuniquei o ocorrido e fui embora. Esperei o prazo para a segunda chamada desta turma.

                Enquanto isso, corrigi as provas da outra turma que fez a prova sem problemas e publiquei suas notas. E nada! Ninguém se inscreveu pra fazer a segunda chamada. Não titubeei. Apliquei zero para toda a turma e publiquei. Foi um alvoroço geral!!! Nesse mesmo tempo, o aluno que foi expulso recorreu às instâncias superiores. Os alunos que levaram zero, também. No caso do zero, logo depois do episódio consumado com a publicação das notas, quiseram me convencer que eu não poderia ter dado zero, porque a prova não teria acontecido! Portanto, sem fato consumado não haveria punição.

                As semanas foram passando e então foi marcada a reunião da Congregação, instância maior da então FCAP. Nessa reunião seriam discutidos o zero da ecologia e a expulsão do aluno de bermuda. A “lavagem quase cerebral” continuava em cima de mim. “Não poderia ter o zero, porque a prova não teria acontecido!” Ai, examinei, pensei, avaliei toda a situação e contexto. Na semana da reunião, ou melhor, dois dias antes, pelo andar da carruagem e pelos murmúrios dos enormes corredores do prédio central da FCAP, concluí com os meus botões (da minha bata inseparável): Os caras vão manter a punição do aluno e vão mandar o professor de Ecologia, no caso eu, fazer nova prova. Escrevi então uma carta que previa antecipadamente este desfecho e mandei para os jornais diários. Um deles, o Jornal O Liberal, publicou na íntegra a minha carta, exatamente no dia da reunião da Congregação. Não deu outra! Foi mantida a expulsão do aluno e o professor de Ecologia teria que fazer nova prova. Acertei na mosca! Pena que não era o resultado da Loteria Esportiva da época!!!

                Ao fim e ao cabo, como diria meu avô português, foi assim decidido pela Congregação. Dias depois, recebi a comunicação para dar ciência e providência. Foi o que eu fiz. Preparei uma prova, marquei a data e realizei a mesma. Só que não me dei ao trabalho sequer de corrigir nenhuma das provas. Apliquei 10 (dez) para todos os alunos. E pensei novamente com os meus botões: Se eu não posso dar zero, quero ver se não posso dar dez!

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Publicado em 21 de fevereiro de 2018 em WEBARTIGOS

Churrasco de mucura


                Papai Curupira, Papai Curupira, olhe aqui o que pegamos! Disse o Paulo Henrique pra mim, quando abri o portão da casa. Era manhã de um sábado, dia em que eu passava o dia inteiro na casa recém-transformada em Casa dos Curupiras, lá na Estrada da Providência, Ananindeua, Pará.
                – Vocês sabem que a gente come esse bicho? Respondi pra eles, todos já dentro da casa, e um deles ainda segurando o bicho. Quando me vi, já tinham chamado a mãe do André para descorar, destripar, enfim, preparar o petisco exótico. Ao ver o resultado desse pré preparo da matéria-prima para o nosso almoço, conjecturei, baseado na quantidade de garotos que estavam presentes:
                – Acho que esse não vai dar pra todos nós! Falei num tom até desencorajador.
                – Eu sei onde tem outro! Eu sei onde tem outro! Gritou o Juarez. Antes que eu respondesse, ele saiu correndo, acompanhado pelos outros garotos. Minutos depois lá tocava o sino do portão novamente e eu fui ver. Eram eles de novo, com mais um animal abatido seguro pelas mãos. Entraram e o mesmo serviço feito ao primeiro se repetiu. Eu então peguei uma churrasqueira que tinha e comecei fazer a minha parte, ou melhor, a parte que eu sabia ou pensava em saber fazer: Assar os bichos!
                – Vamos comer churrasco hoje! Gritei para que todos ouvissem. O menino Renan foi comprar um quilo de farinha e o Hernandes foi preparar um arroz no velho fogão da casa.
                Já eram lá pelas 13 horas quando o churrasco ficou pronto. O sino tocou de novo. Alguém foi abrir e era a Fafá, então minha namorada. Ela veio direto para onde estava a churrasqueira e sem cerimônia, pegou uma das coxinhas já assadas e se deliciou. Chamei toda a turma das crianças e começamos o almoço. Foi só aí que falei pra Fafá:
                – Que tal o churrasco de mucura, gostastes?

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Publicado em 04 de maio de 2018 em WEBARTIGOS

quarta-feira, 1 de setembro de 2021

Tudo ou nada

 

                Aconteceu alguns meses após eu ter começado a minha vida de professor na FCAP/UFRA, lá pelos idos de 1974. Naquele tempo, havia em todos os departamentos, uma entidade formal chamada Comissão de Disciplina. Não, não era tratado a disciplina como comportamento, mas a disciplina matéria. Essas comissões, formadas por diversos professores que ministravam matérias afins, tinham a incumbência, dentre outras, a de analisar em conjunto, as questões, por exemplo, que fariam parte das provas das avaliações curriculares, os chamados NPC’S, NHA’S e NEF’S. Se estavam bem formuladas, dentro dos assuntos tratados, essas coisas. Pois bem. Estava eu participando de uma dessas reuniões no departamento onde eu era lotado, o de Fitotecnia. Ministrava algumas aulas de Silvicultura. Recém-contratado e, digamos, virgem na função. Eram cinco os professores que dela participavam: Prof. Calzavara, Prof. Humberto Koury, Prof. Rubens Lima, Prof. Álvaro Pantoja e eu. 
                – Prof. Gondim! Recebi uma reclamação de um aluno seu. Disse que o senhor é um péssimo professor! Que não sabe ensinar! Portanto, para mim o seu conceito está assim: (E fez aquele gesto de polegar estendido para baixo, com os demais dedos fechados na palma da mão)! Era o prof. Rubens Lima. Empalideci. Calado estava, calado fiquei. Os outros professores presentes entreolharam-se, mais ou menos surpresos. Em um daqueles milésimos de segundos, meu cérebro sentenciou:

                – É tudo ou nada!

                “– Se te calares agora, ele montará o resto da vida em ti!” – sussurrou uma voz mental em meu ouvido… E respondi:

                – Prof. Rubens Lima. O senhor se lembra de um fato acontecido quando o senhor dava aula pra minha turma, ano passado? Sem parar de falar, continuei:

                – Quando, durante um intervalo de sua aula, o prof. Mário Teixeira, de Zootecnia, entrou na sala, pediu licença e começou a “cantar” as notas que faltavam da prova dele, e que toda a turma estava ansiosa em saber? E o senhor, ao retornar à sala, deu a maior descompostura nele? – Vociferei sem parar!

                – Portanto, o seu conceito, a partir daquele momento, ficou assim: E repeti o mesmo gesto feito por ele. Agora, o ambiente ficou agitado. Entraram em ação os “deixa disso” e a reunião se encerrou.
Dias depois, Fui chamado à sala do Departamento de Fitotecnia, pelo Prof. Humberto Koury, que era o chefe de então. Lá, estava presente o Prof. Calzavara, subchefe.

                – O diretor da FCAP quer falar com o senhor! Disse o chefe. Não respondi nada.

                – É sobre aquele episódio acontecido na comissão de disciplina! Falou um deles pra mim. Continuei calado, mas pensei com meus botões:

                – Tôu ferrado! – Em seguida, levantou-se e saímos os três em direção à sala da Diretoria. Eu, no meio, cercado pelos professores Koury e Calzavara. Seguimos quase todos calados, pelos extensos corredores do prédio central. Eu, como se estivesse caminhando em direção à forca ou à cadeira elétrica!!! Entramos todos na imensa sala da diretoria. O diretor, Prof. Elias Seffer, estava sentado em sua cadeira diante da mesa do diretor. Convidou-nos pra sentar e já foi falando:

                – Prof. Gondim! Quero parabenizá-lo pelo seu comportamento. Embora jovem e inexperiente o senhor se comportou muito bem, segundo me disseram os seus chefes.

                – Confesso que eu estava pálido e trêmulo, prestes a receber a corda em meu pescoço ou a descarga elétrica.

                – Diretor. Só fiz o que a minha consciência me mandou fazer… Respondi, agradecido com a frase que repentinamente a minha mente elaborou. Houve alguns comentários a mais em meu favor, ditos pelos meus chefes e saímos.
                Devo registrar, em homenagem a esse grande mestre, pesquisador e engenheiro agrônomo, Rubens Rodrigues Lima, que embora por um certo tempo, nossas relações resumiram-se meramente protocolares e cordiais, quando retornei de meu mestrado em 1977, voltamos a conversar e trocar ideias sobre várzea e outros temas. E ele, na primeira vez que me viu, disse-me, descendo de sua inseparável kombi:

                – Prof. Gondim. Por que o senhor não “pinta” os seus cabelos brancos?! Veja bem, seus alunos podem ficar pensando: O que um “velho” desses está fazendo dentro de sala de aula? E blá-blá-blá…
Mas estes são mais uns quinhentos milhões de reais!

                Fica pra próxima!!!

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Publicado em 06 de fevereiro de 2018 em WEBARTIGOS

O suicídio da galinha que “pensava” ser uma pata

 

                No meu quintal, que apelidei de Meu Nano Universo, crio patos e galinhas Vivem por lá também um jabuti, chamado Porolóco, um coelhinho, de nome Cenourinha, além de alguns intrusos – e que intrusos! –, como ratos e mucuras. Outros, o visitam frequentemente como japus e muitos passarinhos. Nele existem também uma copa de mangueira rosa da vizinha e alguns pés de banana, manga, cacau, tucumã do Amazonas, nins e algumas outras árvores como uma frondosa paineira.

                Recentemente, uma galinha ficou choca e decidiu tomar conta de alguns ovos que sua vizinha, a pata, vinha colocando no ninho ao lado… Totalizavam 10 ovos, quando a pata começou o chocá-los. Como a galinha choca persistia em querê-los para si a tarefa, decidi reparti-los igualmente: 5 ficaram com a pata e 5 com a galinha… No decorrer do período de gestação, ou melhor, incubação, a galinha dava um jeito de puxar para baixo de si, os 5 ovos da pata… Foi preciso eu fazer uma parede, separando os dois ninhos… A incubação chegou ao final, não antes, de um dos 10 ovos terem sido surrupiados ou por um rato ou por uma esperta mucura... Portanto, nasceram 9 patinhos, 5 com a pata e 4 com a galinha.

No seu primeiro dia de vida, a prole dos patinhos nascidos sob a pata saíram do ninho e começaram a explorar o terreiro. Os 4 patinhos da galinha, porém, ficaram com ela dentro do ninho, sob o calor e cuidados da mãe. Dia seguinte, resolvi interferir e toquei os patinhos da galinha do ninho, que os levou para o terreiro. Imediatamente, os 9 patinhos se reuniram em um bando só, sob dois comandos: o da pata e o da galinha. A galinha cacarejava, bicando e ciscando o chão com as suas patas, como se chamasse os patinhos adotados como filhos. A pata, próxima, cercada dos 9 patinhos, grasnava impávida, como se “soubesse” que os filhos eram dela e não da galinha… Mesmo assim, alguns patinhos atendiam ao chamado da galinha e corriam para perto dela… Viveram assim por vários dias, agora confinados em um viveiro dedicado a eles, com fornecimento de comida adequada e suprimento de água permanente. E sem a perturbação dos patos e patas adultos do terreiro.

                Na terceira semana de vida, mais um ataque noturno aconteceu entre a prole dos patinhos! Um deles sumiu! – Teria sido caçado por um rato, uma mucura? Ninguém sabe, ninguém viu… Nessa mesma semana, encontrei um dos patinhos engatado e morto numa tela que separava o viveiro do terreiro… Devidos os tristes fatos acima, tomei uma decisão radical: Vou acabar com a prole dos patinhos! Vendi-os. – Melhor dar-lhes uma chance de vida, do que vê-los sendo devorados soturnamente durante as noites…

                Dia seguinte ao da partida dos patinhos, vi a galinha, estranhamente empoleirada na beira do tanque de banho dos patos do terreiro. Achei estranho. Nunca tinha visto a galinha escalando aquela posição… – Será que ela estava com muita sede? Não dei bola e fui embora.

                No outro dia, aproximadamente na mesma hora, que corresponde ao rotineiro trabalho de distribuir milho e trocar a água do bebedouro, procurei pela galinha por todo o terreiro e não à encontrei. Fui até o tanque de banho dos patos e a cena que vi me espantou e impressionou profundamente: Boiando na água, lá estava a galinha! Morta, mortinha da silva! 

Tirei o seu corpo da água e o examinei cuidadosamente. Não vi nenhuma marca de ataque de bicho, ferida ou outro sinal que indicasse a causa mortis… Comecei a conjecturar os possíveis motivos, as causas deste infortúnio. Sem nenhum argumento científico plausível, levantei a hipótese de suicídio! A galinha sentiu profundamente a ausência dos filhos postiços. Quando à vi na beira do tanque, ela na verdade estava procurando por eles… Como não suportou suas ausências, preferiu dar cabo de sua vida, jogando-se na água como uma pata que não era e morrendo afogada!

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Publicado em 18 de junho de 2016 em WEBARTIGOS

terça-feira, 31 de agosto de 2021

Em 1964!

 

            Em 1964 eu tinha 13 anos. Morava com meus pais e um irmão mais velho, em uma casa simples, na rua Veiga Cabral, quase esquina da TravessaÂngelo Custódio, bairro da Cidade Velha em Belém, Pará. Meu pai, capitão dentista do Exército e minha mãe costureira. Tínhamos uma vida também simples, porém, digna.

            De vez em quando, a rotina era quebrada com alguns fatos que presenciava no quarteirão e mais precisamente na casa ao lado, que fazia esquina com a travessa. Carrões apelidados “rabos de peixe”, zerados, estacionavam ao lado de casa. Eram tantos que enfileirados quase chegavam à esquina da av. 16 de novembro, um quarteirão adiante! No mês de junho, nas festividades juninas, me impressionavam os fogos de artifícios que iluminavam as noites, soltados pelo vizinho da esquina. Eram instalados no chão da rua, bem no cruzamento da Veiga Cabral com a Ângelo Custódio. Um chafariz de luzes coloridas, um vulcão, o que era aquilo? Também soltavam bombas que faziam tremer tudo... Enquanto assistia aquele verdadeiro show pirotécnico das crianças do vizinho, eu e meu irmão, contentava-nos em soltar algumas “estrelinhas” seguras nas pontas dos dedos...De vez em quando uns “estalinhos”… Nada de bombas ou bombinhas. (Só umas “bombinhas” que escondido de meus pais, aprendi à fazer com uma chave de fechadura de porta, um prego, barbante e algumas cabeças de fósforos…Ou ainda, umas bombas mais poderosas feitas com pólvora tirada de outras bombinhas, misturadas com alguns grãos de seixo e embrulhadas em um pedaço de papel, bem amarrado com barbante. Para dispará-las, subia no muro da vizinha em frente e com um paralelepípedo de rua nas mãos, lançava-o sobre a pequena trouxa colocada estrategicamente no chão, próximo do muro e vinha o estrondo…)

            No fim do ano, no Natal, os filhos do vizinho ganhavam carrinhos movidos a pilha, que apitavam, movimentavam-se freneticamente guiados pelos pequenos. Eu e meu irmão ficávamos felizes com os pequenos carrinhos de plásticos que nossos pais nos presenteavam, ou outros brinquedos singelos que íamos pegar no Quartel General do Exército, em frente à Praça da Bandeira, na festa de Natal…

            Quando veio a Revolução (ou Golpe) de Março, meu pai foi convocado para ficar aquartelado em prontidão. Lembro-me dele vestindo a farda e tirando um enorme revólver, que ficava guardado escondido no guarda-roupa do quarto dele.

            Lembro-me nesse instante, que o vizinho da esquina, aquele que dava brinquedos super avançados, que soltava super fogos, e que, digamos, parqueava os carros “rabos de peixe” supermodernos, chegou pro meu pai e pediu, agoniado, quase chorando, que “não dedurasse” ele… Fiquei sem entender muito bem o que significava aquilo.

            Quando meu pai fazia pequenos consertos domésticos em casa, quem o acompanhava e o ajudava, quase sempre era eu. Numa dessas ocasiões, ao subir com ele no forro de casa para consertar algumas goteiras do telhado, vi que o telhado das duas casas, a do meu pai e a do vizinho da esquina eram um só. Não tinha parede separando os dois telhados. Sobre o forro, vi caixas de uísque, tapetes (persas?!) e muitos outros objetos, cuidadosamente guardados pelo nosso vizinho. Entendi então o motivo da súplica do vizinho, dos carros “rabos de peixe”, dos fogos juninos e dos brinquedos de Natal…Ele era um “contrabandista”!

            Políticos de então, davam verdadeiros bacanais em uma casa localizada na beira da estrada Belém – Brasília, na altura da hoje Marituba. A casa ficou famosa pelo desenho que imitava um navio… Era a Casa-Navio!

            Na capital, um outro grande contrabandista de então, inaugurava uma das primeiras lojas de magazines: A RM Magazine. Av. Presidente Vargas com a Travessa Riachuelo. Hoje, seus descendentes, são donos de uma grande organização de comunicação.

            Com a Revolução (ou Golpe) o Pará, especialmente Belém, deu um salto enorme em desenvolvimento. Dominada que era por “contrabandistas” e políticos inescrupulosos a capital, enfim, todo o estado, era isolado do resto do país. Para se deslocar só via aérea e pelas águas.  A estrada Belém – Brasília aberta anos antes, quase todos os meses do ano intransitável, foi finalmente asfaltada. As comunicações deram um salto formidável com a criação da EMBRATEL. As principais ruas e avenidas do centro de Belém, antes de terra ou revestidas de paralelepípedos receberam asfalto. Obras inacabadas e abandonadas foram transformadas em colégios como o Augusto Meira que ocupou um prédio que deveria ter sido uma maternidade, na capital, Belém. A Universidade Federal doPará, UFPa, finalmente foi integrada em um campus à beira do rio Guamá, em Belém, e a Escola de Agronomia da Amazônia, EAA, que tinha apenas um curso, o de Agronomia, foi transformada em Faculdade de Ciências Agrárias do Pará, FCAP, com a criação e funcionamento de novos cursos como o de Engenharia Florestal, Medicina Veterinária e Engenharia de Pesca. Repartições estatais foram transformadas em empresas como o Serviço de Navegação naAmazônia e Administração do Porto do Pará, SNAPP, em Empresa deNavegação da Amazônia, ENASA, o Serviço de Proteção ao Índio,SPI, em Fundação Nacional do Índio, FUNAI. Outras como a Estradade Ferro Belém – Bragança foram simplesmente extintas... Foi criado o Projeto Rondon, um programa de extensão universitária que promoveu o intercâmbio entre os jovens universitários de todo o Brasil, ao mesmo tempo em que proporcionou que esses jovens tomassem conhecimento da realidade brasileira, extramuros das academias.

            A Revolução (ou Golpe) tinha chegado ao norte e Jarbas Passarinho (governador) e Alacid Nunes (prefeito de Belém), foram os dois militares que encararam a missão de recolocar o estado do Pará e a cidade de Belém na linha do desenvolvimento e acabar com a corrupção impregnada nos governos e políticos de então. Se conseguiram, só a história dirá, mas certamente tentaram e mudaram muito para melhor…

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Publicado em 08 de junho de 2016 em WEBARTIGOS

Divulgação do Livro Amazônia: Do Quase Paraíso Verde ao Provável Deserto Vermelho e Cinza

  Olá! Peço que divulguem em suas redes sociais e de algodão... PARA CONHECER MAIS, ACESSE E LEIA:  Onde está publicado e disponível também ...