domingo, 29 de agosto de 2021

Folia no Museu Goeldi

 

Esta história baseia-se em fatos, para mim contados, pelo saudoso e querido

Dr. José Carlos Félix de Oliveira, advogado – pra mim simplesmente Dr. Félix,

morador nas cercanias do Museu Paraense Emílio Goeldi, Belém, Pará,

que me ensinou a evolução dos peixes de pele (sem escamas),

e, na década de 1990 salvou minha pele

da perseguição política da faculdade onde eu trabalhava.

Meu eterno reconhecimento!

              

              – A gente vai ter só quinze segundos para atravessar para o outro lado – sentenciou cronometricamente o pequeno Marco Chafariz.

              – Quantos poraquês têm no lago? – Indagou completamente por fora o Toninho Tonto.

               – Rapaz. São vários. Não tenho a menor ideia de quantos. Uns dezoito, mais ou menos – conjecturou Marco Chafariz.

                O grupo era formado por cinco rapazes. Moleques com a idade média de 13 anos. Estavam reunidos à sombra de um pé de Guajará, a árvore mais antiga, localizada em frente da jaula das onças.

               – Reparem que tem aqueles cipós descendo até o chão…

               – É a “escada-de-jabuti” – informou o esperto Zé do Açaí.

               – Vamos ter que subir por eles?

               – Não, não é nada disso. Quem “sobe” nele só é o jabuti… Corrigiu Marco Chafariz.

               – Bem do lado dele, existem aqueles cipós que são verdadeiras cordas. São aqueles ali – mostrou apontando com o dedo.

              – A gente pode usá-los para passar do lago para a ilha. Da ilha para o outro lado será com as nossas pernas… Apareceu finalmente a opinião do Pedro Mucura.

              – Mas é exatamente lá que os poraquês costumam descansar depois da comida… – disse preocupado o Zé do Açaí

                A reunião vez por outra era interrompida pelos urros da onça-pintada, que mesmo enjaulada, fazia arrepiar os cabelos dos rapazes. Imediatamente se calavam, como se assim o felino parasse de emitir o seu esturro gutural.

                – Se um, apenas um, daqueles peixes elétricos encostar-se na perna de um de nós, será um choque de mais de seiscentos volts! – sentenciou Argemiro, o que se dizia especialista em peixes produtores de energia elétrica.

                – Todos já entenderam a missão? – perguntou Marco Chafariz.

                – Entendi sim. – Disse Toninho Tonto, quase ao mesmo tempo que o Zé do Açaí, o Pedro Mucura e o Argemiro.

                A chuva das duas horas da tarde tinha começado e fez com que a reunião, que estava para findar, ser transferida para o pátio da Rocinha. E pra lá foram.

                – Tem um detalhe. Todos devem pular o muro sem serem vistos pelo Mundó. Ele está uma fera com a gente, desde a última que aprontamos com o macaco punheteiro… – retomou o diálogo o Zé do Açaí.

                – Não se preocupem com isso. Eu sei como despistá-lo. Vou pedir pra Mariquinha Irerê levar um pão doce com refresco de cupuaçu pra ele, lá no portão de entrada. Fico na guarda na esquina. Quando ela chamar por ele, a gente se prepara. Ok? – arrematou confiante Argemiro.

                – Então, tá fechado. Amanhã, quer chova, quer faça sol, às nove da manhã a gente se encontra na esquina da Alcindo com a Independência. Dispersaram-se.

                No outro dia, lá estavam os cinco rapazes moleques – ou seriam moleques rapazes?

Argemiro levava um pão doce embrulhado em papel-manteiga. O refresco era da Mariquinha, que fazia ponto no portão de entrada, vendendo raspa-raspa.

                – Ei Mundó! Vem cá! Tenho uma merenda pra ti – chamou Mariquinha Irerê.

                Mundó que catava umas frutas de taperebá pelo chão se dirigiu até a prestativa Mariquinha.

                – Vamos pessoal! – gritou Toninho Tonto.

                – Ahhhhôôô… ahhhhôôô… – o grito do Tarzan, ou melhor, de cinco Tarzans ecoou no ar do Museu. A bicharada se alvoroçou. A cutia dourada ficou imóvel e depois desembalou pela trilha. O macaco guariba preta interrompeu a acrobacia que fazia no alto da Castanheira. A arara-canindé pôs-se a taramelar. O jacaré-açu, que pegava sol, mergulhou rapidamente n’água. O bando de tartarugas-da-amazônia e tracajás-do-Rio-Negro acompanharam, por sua vez, seus inimigos naturais no banho fora de hora. Momentos depois, a tarefa estava cumprida. O grupo de rapazes moleques se espalhou pela vegetação densa do parque. Mais uma folia no Museu Goeldi.

Para saber mais, clique sobre as palavras sublinhadas em vermelho.

Publicado em 04 de setembro de 2013 em WEBARTIGOS

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